A ficção e a realidade de Nove Noites
Vamos descobrir uma época e "noites" diferentes das que
vivemos.
Este é o ponto de partida da narrativa, um caso trágico, até mórbido,
perdido nos anos e na memória.
O narrador / confessor do antropólogo responde pela parte ficcional de
Nove Noites, ao passo que o próprio Bernardo Carvalho encarna e responde pelo
lado jornalístico, do levantamento de dados que indiquem os reais motivos que
levaram Buell Quain a dar cabo de sua existência. Não se sabe quem investiga,
até porque ninguém nunca lhe perguntou a razão da sua curiosidade. Há a
desculpa de querer escrever um livro, que vai adiantando para não levantar
suspeitas.
A mistura que o autor tenta levar a termo é extremamente interessante
como recurso literário: insere fotos e personagens da década de 1930 na
história, como pessoas reais ou imaginárias, o leitor nunca sabe exatamente
onde está pisando. Pela sua mão somos guiados por entrevistas com pessoas que
privaram com Quain, arquivos públicos, e memórias deixadas em cartas, escritas
pelo suicida antes de morrer, e por um seu amigo, com quem partilhou nove
noites de conversas e revelações.
São vários mistérios que se interligam, e adensam a narrativa, em que o
leitor partilha a claustrofobia e evasão de identidade das personagens.
Da mesma forma, Bernardo Carvalho abre um campo de especulação na mente
do leitor, não somente sobre os motivos que ocasionaram a morte de Buell Quain,
mas principalmente sobre o significado e as consequências da transferência de
um jovem norte-americano para o interior das florestas brasileiras. O autor
junta habilmente a realidade e a ficção, o romance e a investigação que
desenvolveu sobre os índios e sobre o antropólogo. Como nos diz o próprio
autor nos agradecimentos "é uma combinação de memória e imaginação, - como
todo o romance, em maior ou menor grau, de forma mais ou menos direta".
Em outras palavras, Nove Noites é um excelente exemplo de nem sempre
salutar choque cultural!
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